Mona Oliveira é fundadora e co-CEO da BioLinker, uma startup de biotecnologia que desenvolve proteínas recombinantes a partir de uma metodologia própria. Uma ideia de negócio pensada por uma brasileira, nordestina, que dedicou anos à carreira científica enquanto conciliava os estudos com a maternidade.
“Eu costumo me apresentar como mãe, cientista e, por fim, a terceira coisa que me transformei nos últimos anos: empreendedora”, afirma Mona em entrevista ao iFood News.
Não dá para dissociar a maternidade da carreira desta cientista empreendedora. Ela iniciou seus estudos sendo mãe solo da primeira filha, Lana, e teve a ideia de negócio da BioLinker quando estava na licença maternidade de seus segundo filho, Dario, nascido na Eslovênia, onde completou o doutorado em nanotecnologia.
Recentemente, a BioLinker recebeu um investimento de Fabricio Bloisi, presidente do iFood, para expandir a capacidade de desenvolvimento e produção da nova sede da empresa, em Cotia (SP). Bloisi foi um dos mentores de acompanhamento de crescimento e gestão da empresa de biologia sintética e agora é sócio e membro do conselho administrativo.
Na entrevista a seguir, a co-CEO da BioLinker — ela divide o cargo com seu marido, Sandi Ravbar — fala sobre a importância da biotecnologia para a melhora da nossa qualidade de vida e do sistema produtivo e por que decidiram empreender pelo caminho da Nova Economia.
O que faz a BioLinker?
A BioLinker é uma empresa focada em desenvolver proteínas recombinantes e, com uma metodologia própria, a gente consegue acelerar a produção dessas proteínas em mais de 100 vezes. É algo extremamente difícil de se produzir e com uma alta taxa de risco. É nessa dor que a gente trabalha.
O que são essas proteínas e qual a sua importância?
Quando a gente fala de proteínas, quem não conhece pensa logo em whey protein. A gente realmente ouve muito isso. Mas as proteínas elas estão dentro de vários mercados e é muito legal para mentes como a minha, que gostam de coisas novas. Toda semana a gente pode trabalhar com um produto de um mercado completamente diferente.
Anticorpos usados em um tratamento ou para diagnóstico, enzimas que degradam a cana-de-açúcar para fazer etanol, bioativos, tudo isso são proteínas. Existem proteínas que movimentam US$ 1 trilhão. Temos uma infinidade de proteínas nos mais diversos organismos, algumas que ainda nem sabemos para o que servem. Na área de pesquisa, eu tenho uma infinidade de possibilidades. E cada vez mais a gente vai querer entender isso.
A BioLinker é uma startup 100% brasileira. Por que vocês decidiram ser uma empresa da nova economia?
Como uma startup, a gente propõe um modelo de negócio completamente novo. Não existe uma empresa que desenvolva proteínas recombinantes usando essa tecnologia e oferecendo os mesmos serviços que a BioLinker. É um sistema semiautomatizado, que tecnicamente chamamos de “sistema in vitro de produção de proteínas recombinantes”. Hoje atuamos na produção dessas proteínas de forma escalável. No nível da pesquisa e desenvolvimento é possível fazer, mas no nível industrial tem uma série de desafios. É aqui que estamos fincando a nossa bandeira.
E hoje vocês atendem a indústria?
Já conseguimos trabalhar com escalas industriais, que têm um número de pedido menor, mas com um tíquete médio alto, mas não deixamos de atender a pesquisa, que tem um número maior de pedidos, mas de pequena escala. Esses são os dois perfis de clientes que a BioLinker atende. Mas isso foi como uma estratégia de sobrevivência. O Fabricio Bloisi falou algo interessante sobre isso, comparando nosso momento com o de quando ele começou no ramo de softwares. Ele disse que como as empresas não recebiam investimentos, elas faziam de tudo porque precisavam sobreviver. A mesma coisa ele observou quando viu que a gente atende todos esses segmentos [saúde, farmacêutico, alimentos e agro]: “vocês fazem isso porque não recebem investimentos para que se possa focar em um só”. Estamos agora nessa etapa de decidir dentre a nossa carteira de clientes quais serão aqueles que vão receber um maior foco da empresa e onde a gente vai atuar melhor.
Você sempre quis empreender?
Eu vim de uma família de empreendedores, comerciantes. Eles chegaram a ter sucesso, mas também viram a ruína dos negócios. Então, na minha memória, empreender tinha tanto o lado do sucesso como o da derrota. Então, por uma questão familiar eu guiei minha carreira, por uma questão de sobrevivência, de ter um emprego e não dar trabalho. Nunca gostei de pensar “vou me arriscar e se der tudo errado que se dane, volto para a casa da minha mãe”. Mas eu acho que no fim, eu sempre tive essa fagulha por querer riscos, por achar que eu consigo, por coisas novas. Sempre tive a inquietação de querer construir com as minhas descobertas, com o que eu desenvolvia dentro de um laboratório. Eu queria impactar a vida de várias pessoas. Acho que só adiei um pouco esse sonho para quando tivesse condições para poder arriscar.
Qual é o estágio da biotecnologia no Brasil e para onde ela pode caminhar?
Hoje a gente pode entender a biotecnologia como uma solução para os problemas para a produção. Na biologia sintética, que é um segmento da biotecnologia e o campo em que atuamos, a gente meio que usa a inteligência da natureza. Um exemplo hipotético: um sapo na Colômbia que produz uma substância em sua pele que é antimicrobiana. Essa é uma inteligência criada pela natureza a partir da evolução e a gente consegue pegar aquele código genético, fazer um processo de manipulação genética no laboratório e produzir esse benefício sem precisar matar o sapinho. É um processo de produção verde em que se tem algo idêntico ao que a natureza já oferece, mas sem agredi-la.
Existem outras startups que manipulam organismos para captar carbono da atmosfera, para produzir substratos de petróleo, para degradar plástico, tudo isso para criar formas mais sustentáveis de a gente manter a economia ao mesmo tempo em que está em harmonia com a Terra, o que conversa com a temática ESG e de todas as outras tantas políticas que o mundo vem criando. Só a biotecnologia vai ajudar com isso.