Um festival de música vai muito além de refletir as preferências sonoras de seu público. É o caso do The Town, o tão aguardado evento que acontece em setembro e terá, em São Paulo, mais de 235 horas de apresentações de artistas nacionais e internacionais em uma área de 360 mil metros quadrados.
É “a música além da música”, como define Zé Ricardo, diretor artístico do festival e curador, entre outros palcos, do The One, que reunirá nomes como Ney Matogrosso, Racionais MCs e Gloria Groove e tem copatrocínio do iFood, uma empresa 100% brasileira.
Em entrevista exclusiva ao iFood News, Zé Ricardo, que também é diretor artístico de outro megafestival de destaque, o Rock in Rio, explica como o The Town, ao despontar como uma vitrine para a pluralidade de vertentes musicais, estabelece uma narrativa de questionamento de preconceitos e de afirmação da diversidade social. “É uma provocação através do entretenimento”, resume.
iFN – O The Town é um festival que surge com a proposta de celebrar São Paulo e as múltiplas faces da diversidade que a cidade oferece. Como esse propósito se reflete nas escolhas do line-up, palcos e formatos?
Zé Ricardo – Cada detalhe no The Town foi pensado para trazer os diálogos que a cidade oferece. São Paulo é uma cidade plural, mas capaz de absorver não só diferentes pessoas de diversos Estados do Brasil e muitos países do mundo, mas diferentes estilos de música.
Uma cidade como São Paulo tem lugares de jazz e músicos sobrevivendo nesses locais. Também abriga os maiores musicais do país, sempre lotados, e tem a capacidade de receber vários shows de música urbana em várias partes da cidade, todos cheios.
A construção de cada detalhe do The Town é baseada nisso, nessa pluralidade de São Paulo. Os artistas foram pensados assim, bem como as escolhas de palco, como o São Paulo Square, voltado para o jazz, e um dedicado aos diversos gêneros da música urbana – hip-hop, trap, samba, afrobeat.
iFN – O The Town pretende se estabelecer como um grande evento da cultura brasileira, um espaço já conquistado pelo Rock in Rio, por exemplo. Quais os pontos altos do festival, em termos artísticos?
Zé Ricardo – Claro que dar visibilidade a novos artistas de diferentes vertentes musicais é um dos principais objetivos, porque é disso que se trata um festival de música. Você vai para ver seu artista preferido e sai de lá com mais quatro artistas maravilhosos que você não conhecia e pelos quais se apaixonou.
O festival de música tem essa função social de ampliar o leque de opções culturais de seu público e de quem confia em sua curadoria. Por isso é que a curadoria de um festival tem que ser levada muito a sério, e o mergulho tem que ser profundo.
As pessoas que compram ingresso para o The Town querem ser tomadas pela magia de coisas que elas não sabiam que existiam. O The Town vira ponto de referência para essas pessoas no futuro.
Cada festival ao redor do mundo tem sua personalidade. The Town e Rock in Rio têm uma personalidade única, não dá para identificá-los com nenhum outro megafestival. São festivais com muito detalhe na entrega, muito conteúdo, muita pesquisa em si mesmos para descobrir como podem melhorar.
O The Town se alinha com o Rock in Rio nesse objetivo de megafestival, mas são festivais muito particulares e que têm suas identidades muito claras para o público.
iFN – Como foi feita a seleção dos artistas e de que forma eles refletem a cultura paulistana?
Zé Ricardo – O The Town tem um projeto de curadoria pensado nos detalhes. Cada artista que está ali é protagonista de uma narrativa que o festival quer contar como um todo.
Em cada palco, a presença da cultura paulistana está muito clara, desde quando falamos do mais pop, como Luísa Sonza e Jão, até clássicos que fazem o jazz misturado com a música brasileira, como a banda Mantiqueira, a Vanessa Moreno, a Paula Lima, a Annalu.
No palco Factory, você encontra Grag Queen, MC Don Juan. A cultura de São Paulo está pincelada em muitos shows que estamos criando para o festival, não só nos artistas que nasceram em São Paulo, mas no que representam para a cultura paulista.
A construção do line-up é feita com muita pesquisa, mas também com muita intuição, muito mergulho. É um olhar amplo para a cena musical que acontece no Brasil e no mundo.
Assim, apresentamos um festival muito diverso, plural, e a curadoria constrói sua narrativa através desses personagens.
iFN – Dar visibilidade a artistas de diversas vertentes musicais é um dos intuitos do festival?
Zé Ricardo – O The Town mostra a sua força porque todos os seus palcos são palcos fortes. Mesmo que não estivesse no The Town, o palco São Paulo Square, por exemplo, venderia, por si só, muitos ingressos, assim como o palco Factory ou o The One.
Temos uma grandiosidade de artistas em todos os palcos, com milhares de seguidores. O Bruno Mars vem para um show exclusivo na América do Sul, o que é privilégio de um festival que tem muita capacidade de contratação.
O The One tem um diálogo de música internacional e nacional, é um palco muito poderoso, que venderia ingressos totalmente fora do The Town. Esses conjuntos fazem com que o The Town se firme como um dos maiores festivais da América do Sul já no seu primeiro ano.
E seu line-up tem artistas de várias partes do Brasil. A riqueza artística no São Paulo Square, por exemplo, inclui Esperanza Spalding e Hermeto Pascoal. Temos todos os dias uma big band recebendo só cantoras mulheres, duas cantoras por dia fazendo sempre homenagens a grandes divas do jazz internacional e nacional, porque aqui colocamos Elis Regina e Elza Soares como cantoras de jazz, que é o lugar delas também.
Cada palco tem a sua narrativa muito clara, nenhum artista está ali por um projeto de contratação, e sim por um projeto de curadoria. Em um país tão amplo e diverso culturalmente como o Brasil, você consegue encontrar no The Town partes de vários lugares.
iFN – Qual a importância da curadoria do The One em termos de fortalecimento da cultura brasileira?
Zé Ricardo – O The One é o maior exemplo de como no The Town utilizamos artistas para serem personagens principais das narrativas que queremos contar. Ele tem uma importância enorme para a cultura brasileira, mas também para o diálogo de humanidade que está se apresentando no mundo.
No dia 10, temos Marina Sena cantando Gal Costa, Pabllo Vittar recebendo Liniker e Jup do Bairro, Jão, Gloria Groove. As pessoas superficialmente poderiam olhar e falar que é um dia de temática LGBTQIAP+.
Mas a nossa proposta é que esse dia seja de olhar para o futuro, em que as pessoas possam ser quem elas são, sem julgamentos, sem nenhum tipo de preconceito. Essa é uma provocação do The Town, uma afirmação da importância de nós podermos ser quem nós somos, e o The One é protagonista nesse diálogo.
No dia 7, teremos um diálogo da música preta mundial, começando com o samba da Maria Rita, passando pela música africana, com a Angélique Kidjo, ganhadora do Grammy e a mais premiada artista da África.
Depois vamos para o hip-hop com jazz do Masego, e acabamos no pop soul RnB do Ne-Yo. É uma narrativa musical muito clara, e esses artistas são grandes protagonistas para nos ajudarem a contar essa história.
No dia 3, temos Matuê, Ney Matogrosso e Seu Jorge em um diálogo de gerações, mostrando para o público que é possível curtir um festival com pessoas de diferentes idades, em que todo mundo acaba encontrando o seu lugar.
A ideia é que o The One seja a música além da música, que coloque as pessoas para pensar em seus preconceitos e suas miopias enquanto sociedade. É uma provocação através do entretenimento.