A falta de acesso a alimentos frescos nas cidades pode ser resolvida com hortas urbanas
A cada dia, devemos comer ao menos cinco porções (ou 400 g) de frutas e hortaliças, recomenda a OMS (Organização Mundial da Saúde). Será que todo mundo consegue atingir esse objetivo? Quem vive em um deserto alimentar, não.
Mas, afinal, o que é um deserto alimentar? Esse termo é usado para descrever uma área rural ou urbana (em geral empobrecida) onde o acesso a alimentos frescos é raro ou não existe.
Isso pode acontecer, por exemplo, porque nesses lugares não se acham feiras livres ou mercados que ofereçam alimentos como frutas, legumes e vegetais para venda (ou onde esses locais e alimentos até existem, mas o preço desses é inacessível às pessoas). Em outros casos, mesmo que esses estabelecimentos existam, estão longe demais para ir a pé.
O uso da palavra “deserto”, nesse caso, é proposital, uma vez que nos desertos reais também temos dificuldade para achar alimentos frescos e para nos locomover. A expressão surgiu na Escócia, no início dos anos 1990, para descrever a escassez de acesso a comidas nutritivas por residentes de áreas com moradia subsidiada pelo governo.
Mas, antes disso, nos anos 1970, a palavra “deserto” já era utilizada para descrever regiões periféricas de uma cidade que não tinham elementos importantes para o desenvolvimento da comunidade.
Por que o deserto alimentar é um problema?
No Brasil, em 12 de 21 capitais, os subdistritos onde há menos estabelecimentos que oferecem alimentos saudáveis são aqueles onde vivem os grupos de menor renda, aponta o estudo técnico “Mapeamento dos Desertos Alimentares no Brasil”, realizado pelo Ministério do Desenvolvimento Social em 2018.
Já nos Estados Unidos, um estudo do Congresso feito em 2021 aponta que 6% da população (19 milhões de pessoas) vive em áreas de desertos alimentares. Para os estadunidenses, uma área de baixo acesso a alimentos in natura é aquela em que ao menos um terço da população (acima de 500 pessoas) vive a mais de 1,6 km de distância de um supermercado ou mercearia, nas cidades, ou a mais de 16 km, no campo.
Quem mora em regiões consideradas desertos alimentares em geral tem uma dieta desbalanceada e, por isso, maior propensão a desenvolver problemas de saúde e obesidade.
Em sua tese de doutorado, Ana Clara Duran, pesquisadora da Faculdade de Saúde Pública da USP (Universidade de São Paulo), mostra, por exemplo, que quem vive perto de lugares que vendem frutas as consome com mais frequência.
Para a pesquisadora Hillary Shaw, especialista no tema, além da barreira física e econômica, existe uma outra, menos tangível, que pode piorar o problema: a atitude mental e o nível de informação das pessoas sobre a qualidade dos alimentos que ingerem no dia a dia.
Segundo este documento preparado pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, o Idec, com apoio do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde – Nupens USP, algumas medidas que podem ser tomadas para acabar com os desertos alimentares são:
- Estimular pequenos estabelecimentos a vender mais produtos in natura;
- Dedicar espaços públicos, como praças, para a criação de hortas comunitárias (você já conhece as hortas urbanas?);
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Oferecer produtos in natura na alimentação escolar, em restaurantes populares e refeitórios de empresas;
- Criar meios para que as feiras livres cheguem até os desertos alimentares;
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Regular o estabelecimento de restaurantes de fast food muito próximos uns aos outros, sobretudo em desertos alimentares.
Hortas urbanas são uma solução?
Uma das ações que já estão sendo propostas para melhorar a questão dos desertos alimentares nas cidades é aproveitar terrenos ociosos para criar hortas urbanas. O projeto São Paulo Composta, Cultiva, liderado pelo Instituto Polis, por exemplo, propõe a criação de 50 hortas urbanas em São Paulo.
Na região metropolitana de São Paulo, a adoção de hortas urbanas tem potencial para abastecer 20 milhões de pessoas por ano com verduras e legumes com uma área de 60 mil hectares cultivados, de acordo com o estudo “Mais perto do que se imagina: os desafios da produção de alimentos na metrópole de São Paulo”, realizado pelo Instituto Escolhas em 2020.
O iFood, por exemplo, tem uma horta urbana no sétimo andar do prédio de sua sede, em Osasco (SP). Em uma área de 950 m2, cerca de 1,7 tonelada de alimentos como alface, rúcula, tomate e abobrinha são cultivados por mês. E toda a produção é doada para o Banco de Alimentos de Osasco.
Além disso, outras quatro hortas urbanas são financiadas pela foodtech em escolas públicas de São Paulo e Ferraz de Vasconcelos, onde o cultivo aproveita espaços ociosos dos terrenos para alimentar os estudantes.