O iFood e o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica, que zela pela livre concorrência de mercado) assinaram no dia 8 de fevereiro um acordo sobre os contratos de exclusividade fechados entre a empresa e alguns dos restaurantes parceiros da plataforma.
Os contratos de exclusividade são aqueles em que os restaurantes parceiros se comprometem a não disponibilizar sua operação de delivery em outras plataformas e, em troca, recebem investimentos do iFood e condições comerciais diferenciadas —uma prática legal e em conformidade com a legislação concorrencial brasileira.
Por meio do acordo firmado, o Cade reconhece que a prática da exclusividade é legal, viabiliza investimentos nos restaurantes e ainda gera eficiência para consumidores. Além disso, o órgão estabelece critérios de legalidade e limites para a celebração de contratos de exclusividade com restaurantes.
“As mudanças previstas no acordo trarão mais segurança jurídica para o setor como um todo e implicarão em mudanças na política de exclusividades do iFood”, explica Arnaldo Bertolaccini, vice-presidente de restaurantes do iFood.
Agora, a empresa terá seis meses para implementar as mudanças propostas pelo Cade —como não firmar contratos de exclusividade com marcas que tenham mais de 30 estabelecimentos e limitar o prazo desse tipo de contrato a dois anos.
A seguir, confira a entrevista na qual Arnaldo explica o que muda com as novas regras na relação entre o iFood e os restaurantes (exclusivos ou não).
iFN – Qual é o impacto do acordo firmado com o Cade no negócio do iFood?
Arnaldo – O acordo tem impactos relevantes nos negócios do iFood, e mesmo assim trabalharemos para que ele seja totalmente implementado dentro do prazo e das condições que foram estabelecidas.
Nossa primeira ação será trabalhar junto aos restaurantes parceiros que serão impactados para garantir que eles continuarão recebendo o nosso melhor atendimento, mesmo sem o contrato de exclusividade.
Os acordos de exclusividade com alguns restaurantes serão mantidos, desde que sigam a determinação do Cade. Nossa preocupação maior é garantir que os restaurantes impactados possam continuar contando com todo o apoio para que o impacto em suas operações seja minimizado na medida do possível.
Existem casos em que os termos e as condições comerciais precisarão ser renegociadas. Nesses casos, nossa equipe comercial entrará em contato, nos próximos dias, com cada estabelecimento afetado para dar início ao processo.
Já os restaurantes parceiros sem contrato de exclusividade não sofrerão qualquer alteração em seus contratos, condições comerciais ou qualidade da prestação do serviço. Respeitados os limites previstos no acordo com o Cade —e caso tenham interesse—, esses restaurantes poderão firmar parcerias exclusivas com o iFood a partir de agora.
iFN – Como se deu esse processo com o Cade?
Arnaldo – O iFood vem colaborando com o Cade desde o início do inquérito, que culminou na celebração do presente acordo. Ele reconhece não só a dinamicidade do setor de delivery de comida, marcado pelo surgimento de diversos modelos de negócio, como também a importância e a legalidade da prática de exclusividade, desde que respeitados certos limites estabelecidos no acordo. A atuação do iFood sempre se deu dentro dos limites legais.
As políticas comerciais do iFood estão em conformidade com a legislação concorrencial e cumprimos integralmente os termos da medida preventiva imposta pelo Cade em março de 2021. O iFood sempre respeitou e continuará respeitando as decisões do órgão.
iFN – Como é um contrato de exclusividade entre o iFood e os restaurantes?
Arnaldo – Assim como em qualquer mercado, um contrato de exclusividade pressupõe investimentos em determinado negócio no qual se busca um retorno do aporte realizado e por acreditar que faz sentido diante da sua estratégia de mercado.
A exclusividade nada mais é do que preservar esse investimento por um período de tempo para evitarmos o que chamamos de efeito carona. Este se dá quando um outro concorrente deseja usufruir dos resultados sem ter feito nenhum aporte ou esforço.
iFN – Por que seguir com os contratos de exclusividade, se eles são tão criticados?
Arnaldo – É importante ressaltar que os contratos de exclusividade não são ilegais. O que precisamos são regras claras para toda a indústria. Os restaurantes disseram ao Cade que preferem o iFood pela qualidade do serviço, da plataforma e do atendimento que prestamos.
Ao mesmo tempo, o iFood expande o mercado. Os contratos de exclusividade servem para equilibrar as contas do investimento que fazemos para atrair clientes para o setor de delivery, algo que beneficia até mesmo os nossos concorrentes.
iFN – Concorrentes alegam que os contratos de exclusividade reservam mercado e tornam a competitividade do setor praticamente impossível. É verdade?
Arnaldo – Não. Setores competitivos beneficiam diretamente os mais interessados no desenvolvimento daquele mercado. Neste caso, o restaurante é quem mais ganha.
O Cade enviou requisição para mais de 30 restaurantes perguntando sobre a relação com as plataformas e os contratos de exclusividade. As respostas mostram que eles não se sentem dependentes dos contratos, que o delivery é apenas parte da sua receita, e que o que os faz optar pelo iFood é a qualidade da plataforma e da prestação de serviço, indo na contramão do que a Rappi tem alegado.
iFN – Segundo a Abrasel, o iFood tem um monopólio de 80% do mercado. Isso é verdade?
Arnaldo – Esse dado que a Abrasel apresenta não tem uma metodologia clara e não leva em conta todas as modalidades de entrega. O Brasil conta hoje com inúmeras plataformas de delivery, especialmente fora dos grandes centros. A competitividade é grande, com empresas como Magazine Luiza, Americanas, Ambev e Grupo Pão de Açúcar investindo no setor.
A própria Abrasel também diz que metade dos pedidos de restaurantes são feitos por apps próprios dos estabelecimentos ou Whatsapp. Um levantamento do Sebrae aponta que 74% dos pequenos negócios atuam no comércio eletrônico e que o WhatsApp é a plataforma mais usada para vendas, sendo adotada por 84% deles. Os apps de delivery são adotados por apenas 6% dos estabelecimentos.
iFN – Quais são os limites definidos pelo acordo?
Arnaldo – Os limites do acordo com o Cade são:
- No máximo, 25% do volume de vendas (GMV) no iFood poderá estar atrelado a restaurantes exclusivos. Nos municípios com mais 500 mil habitantes, apenas 8% dos restaurantes que trabalham com a plataforma poderão assinar contrato de exclusividade. O iFood terá seis meses para se adequar a esses limites.
- Novos contratos de exclusividade podem ser firmados pelo iFood, porém devem ser limitados a um período máximo de dois anos. Após esse período, o restaurante em questão deverá se sujeitar a uma “quarentena” e permanecer sem exclusividade com o iFood pelo período mínimo de um ano.
- Como regra geral, os contratos de exclusividade que estejam hoje em vigor e que já tenham acumulado dois anos de exclusividade se enquadram na “quarentena” imediatamente após a sua data atual de vencimento. Há exceções a essa regra a depender dos investimentos feitos pelo iFood no contrato de exclusividade e do crescimento gerado para o parceiro exclusivo, que serão tratadas individualmente pelo time comercial do iFood junto aos restaurantes impactados.
- O iFood não poderá firmar contratos de exclusividade com marcas que, no momento da celebração ou renovação contratual, tenham 30 ou mais estabelecimentos. Os contratos atualmente vigentes com marcas que se enquadrem nessa proibição deverão ser encerrados até 30/09/2023.
- O acordo tem duração de quatro anos, e seu acompanhamento será feito por um terceiro independente escolhido pelo iFood e aprovado pelo Cade, por meio de relatórios semestrais.
iFN – Quais serão os próximos passos do iFood a partir de agora?
Arnaldo – Reiteramos o nosso compromisso de desenvolver o setor de delivery de comida e aumentar o bem-estar dos consumidores, vamos trabalhar para adequar o nosso modelo de negócios às novas regras. Nosso objetivo é oferecer a melhor plataforma para entregadores, consumidores e restaurantes.