Em dezembro, o STF (Supremo Tribunal Federal) realizou uma Audiência Pública para aprofundar o debate sobre a dinâmica do trabalho por meio de aplicativos – que contou com a participação do CEO do iFood, Diego Barreto.
Nesse contexto, qual seria o efeito de uma eventual obrigatoriedade de estabelecer um vínculo empregatício, nos moldes da CLT, de entregadores e motoristas de aplicativos com as empresas operadoras das plataformas?
Um estudo realizado pela consultoria econômica Ecoa mostra que a adoção do regime da CLT por trabalhadores por aplicativos poderia levar à perda de 905 mil postos de trabalho, reduzir a renda dos trabalhadores em até 49% e causar um impacto negativo de até R$ 33,1 bilhões no PIB brasileiro.
Essa pesquisa foi realizada a pedido da Amobitec (Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia, da qual o iFood faz parte) e seus dados foram apresentados na Audiência Pública no STF nesta segunda-feira (9/12).
Vínculo empregatício impactaria no aumento de custos e redução da demanda
Segundo o estudo da Ecoa, a formalização de vínculo empregatício com trabalhadores por aplicativos elevaria os custos trabalhistas e tributários das empresas operadoras dessas plataformas. Consequentemente, isso causaria um aumento de 25,9% no preço das entregas e de 19,7% a 32,5% no valor das viagens, segundo projeções da consultoria.
Essa elevação de preços poderia, por sua vez, reduzir a demanda por esses serviços, levando à perda de 905 mil postos de trabalho – 614 mil entre motoristas e 291 mil entre entregadores. No caso do delivery, isso significa uma redução de 75% do atual contingente de entregadores.
Além do impacto da diminuição da demanda nos postos de trabalho, o cálculo considera ainda que trabalhadores em jornada integral substituiriam trabalhadores ocasionais, que são grande parte do contingente das plataformas.
No iFood, por exemplo, 90% dos entregadores trabalharam menos de 90h mensais em 2023 – apenas 0,5% tiveram uma jornada de 180h a 220h, equivalente à de celetistas.
Para ilustrar o efeito da celetização sobre o nível de ocupação, o estudo cita o caso de Genebra (Suíça), que passou por um reenquadramento no formato de contratação de entregadores por aplicativo em setembro de 2020.
A cidade teve uma redução de 42% no número de pedidos e de 67% na quantidade de profissionais ocupados – 79% dos entregadores que deixaram a plataforma seguiram desempregados nos seis meses seguintes à mudança de enquadramento.
Redução da renda e impacto no PIB
A pesquisa estima que, com a celetização, a massa de renda dos motoristas poderia cair entre 20% e 30% (entre R$ 11,1 bilhões e R$ 16,3 bilhões), enquanto a dos entregadores seria reduzida entre 43% e 49% (entre R$ 2,2 bilhões e R$ 2,5 bilhões).
Esse impacto negativo na renda dos trabalhadores teria reflexos diretos no consumo e, consequentemente, no PIB. “Demanda menor significa redução da oferta de trabalho e da remuneração, o que gera um choque negativo na renda das famílias, com implicações sobre o nível de consumo agregado da economia”, explica a economista Silvia Fagá, responsável pela Ecoa.
A partir desse choque de demanda, a consultoria analisou seus efeitos em fluxos econômicos intersetoriais e na macroeconomia, levando em conta as contas públicas e a estrutura produtiva do país.
Dessa forma, a Ecoa estima que a formalização do vínculo empregatício de trabalhadores por aplicativos causaria um impacto de R$ 33,1 bilhões, que deixariam de ser somados ao PIB brasileiro – e provocaria uma perda de arrecadação fiscal de R$ 2 bilhões.
Posicionamento do iFood e do setor
O posicionamento da Amobitec, entidade que representa o setor, é o de que a relação entre plataformas digitais e profissionais parceiros cadastrados não caracteriza vínculo de emprego.
Esse vem sendo o entendimento majoritário das decisões do Judiciário no Brasil, inclusive no âmbito do Supremo Tribunal Federal, cuja 1ª Turma já decidiu, de forma unânime, que precedentes vinculantes do STF admitem formas alternativas de contratação no mercado de trabalho.
Na Audiência Pública de 9 de dezembro, o ministro Aloysio Corrêa da Veiga, presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), apresentou números mostrando que a Justiça do Trabalho reconheceu vínculo empregatício entre motoristas de aplicativo e as plataformas digitais em 2% dos casos.
Na lacuna legislativa, o iFood tem apoiado, desde 2021, a regulação do setor em diálogos com o governo federal, o Congresso e representantes de trabalhadores. A empresa considera fundamental a construção de um modelo equilibrado, que permita às plataformas avançar em termos de geração de negócios e, especialmente, em renda e proteção social para os entregadores.