Desigualdade racial reduz acesso de jovens negros à faculdade

Pesquisa brasileira mostra que pessoas pretas e pobres têm mais barreiras no acesso à faculdade em relação a pessoas brancas e pobres

Será que a cor da pele e a classe social interferem no acesso ao ensino superior? Um estudo que cruzou dados de 1,12 milhão de alunos, resultados do Enem e informações do Censo da Educação concluiu que sim, informa a Folha de São Paulo.

De acordo com a pesquisa, os brasileiros mais ricos têm mais oportunidades do que os mais pobres em um contexto geral —mas, quando se trata de pobres que também são negros, a desigualdade fica ainda maior. 

Segundo Flavio Carvalhaes, um dos autores da pesquisa, o motivo, ao contrário do que se pode pensar, não se deve a questões demográficas. “Há, no Brasil, uma ideia de que há desvantagens apenas socioeconômicas e que os pretos são prejudicados porque são a maioria dentre os pobres, e não em razão do racismo”, explica.

“Fomos, então, avaliar os resultados em cada faixa de renda. Se a desigualdade só tem a ver com isso, o resultado de brancos e pretos dentro do mesmo nível socioeconômico teria que ser igual. E não é isso o que acontece”, completa.

A partir do estudo, foi possível identificar, dentro de uma mesma faixa de renda, a desigualdade nas notas obtidas no Enem de acordo com a raça. A média das notas de pessoas brancas eram sempre maiores do que a de pessoas pretas, pardas ou indígenas.

Entre pessoas na faixa de renda mais baixa, de 0,25 salário mínimo per capita (cerca de R$ 303), a mediana das notas de brancos é 468,83, enquanto a de pretos, pardos e indígenas era de 455,3.

Analisando a faixa de maior renda, com mais de 1,75 salário mínimo per capita (cerca de R$ 2.121), a mediana das notas dos brancos é 610,13 e a dos pretos, pardos e indígenas fica em 585,83.

Ou seja: apesar de que, com o crescimento da renda, crescem também as notas, a desigualdade racial ainda impacta nesse resultado, uma vez que a média das notas de pretos, pardos e indígenas é sempre inferior à de brancos.

Importância da política de cotas nesse cenário

Para Anna Carolina Venturini, doutora em Ciência Política pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro e pesquisadora do Núcleo do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, “estudos como esse são de extrema relevância no cenário atual”.

Isso porque, de acordo com os dados obtidos com a pesquisa, é possível perceber que renda, raça e a interseção entre elas podem impactar diretamente nas oportunidades de ingresso ao ensino superior.

“Essa pesquisa, que se soma a outros estudos dessa área, comprova ser essencial combinar cotas sociais (que consideram a renda familiar e a conclusão do ensino médio em escola pública) com as cotas raciais. No Brasil, a cor/raça das pessoas é um fator adicional e estruturante das oportunidades educacionais”, completa Anna.

Essa interferência é fruto do racismo histórico e estrutural do país, em que pretos, pardos e indígenas têm uma herança de gerações com menos oportunidades do que brancos, explica Flavio. “Os mecanismos de estereótipos e de discriminação que ainda existem no ambiente escolar podem levar alunos de grupos raciais desprivilegiados a terem desempenho e expectativa educacional menor”.

O estudo apresenta um norte para o que deve ser levado em conta em um contexto de possível revisão da Lei de Cotas (12.711/2012) pelo Congresso, o que pode trazer mudanças na determinação de que 50% das vagas das universidades federais sejam reservada a alunos de escolas públicas e que, dentro desse universo, haja cotas para pretos, pardos e indígenas na proporção dessa população em cada estado.

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